O direito ao acesso a absorventes higiênicos, de forma gratuita, fornecidos pelo poder público no município de Castanhal/PA.

Mesmo em pleno século XXI a discussão envolvendo menstruação é cercada de tabu. Todavia, seu debate é necessário, assim como o debate acerca da tributação de absorventes higiênicos como forma de combate à pobreza menstrual. No segundo semestre do ano passado, o Presidente Jair Bolsonaro sancionou a Lei nº 14.214, de 06 de outubro de 2021, que cria o Programa de Proteção e Promoção da Saúde Menstrual, mas vetou trechos importantes que previam a distribuição gratuita de absorvente feminino para estudantes carentes, mulheres em situação de vulnerabilidade e presidiárias. Após severas críticas, no dia 08 de março de 2022, Dia Internacional da Mulher, o Presidente voltou atrás e assinou o Decreto nº 10.989, sobre proteção da saúde menstrual e distribuição gratuita de absorventes e outros itens de higiene. Pobreza ou precariedade menstrual é termo utilizado para designar à falta de acesso de meninas, mulheres e homens trans a condições básicas para manter uma boa higiene no período da menstruação, como a água canalizada em seus domicílios, acesso a itens de limpeza pessoal, não se restringindo à falta de dinheiro para comprar absorventes. Por não terem acesso a absorventes, muitas mulheres ainda improvisam com jornal, miolo de pão e paninhos, que podem gerar infecções e outros problemas na região íntima. A revista GZH¹ realizou, no segundo semestre de 2021, uma reportagem impactante, sobretudo por trazer uma realidade pouco discutida, acerca da pobreza menstrual. De acordo com o texto, um levantamento nacional inédito, coordenado pela antropóloga Mirian Goldemberg, da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, mostra que 01 (uma) em cada 04 (quatro) jovens brasileiras já faltou à escola por não ter dinheiro para comprar absorvente. Essas meninas podem perder até 02 (dois) meses de aula durante 01 (um) ano por ter que ficar em casa durante o período menstrual. Uma boa alternativa para combater a pobreza menstrual e facilitar o acesso das pessoas que menstruam aos absorventes é diminuir a tributação sobre os produtos de higiene menstrual. O Quênia foi o primeiro país a suprimir a tributação sobre esses produtos². Em 2018, a Índia eliminou a taxa de 12% (doze por cento) que ainda havia sobre os absorventes, tornando-os livres de tributação, cabendo destacar que, no país, cerca de 70% (setenta por cento) das mulheres não podiam comprar absorventes por causa do preço³. No Brasil, os absorvente higiênicos estão sujeitos à alíquota 0 (zero) de Imposto sobre Produtos Industrializados – IPI, todavia, se considerarmos o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços – ICMS, o Programas de Integração Social – PIS e a Contribuição para Financiamento da Seguridade Social – COFINS, chegamos a uma tributação de 34,48% (trinta e quatro vírgula quarenta e oito por cento), de acordo com o Impostômetro da Associação Comercial de São Paulo4, o que coloca o nosso país dentre os que mais tributam absorventes e tampões no mundo. No que tange ao ICMS, a Constituição Federal de 1988 estabeleceu que o mesmo poderá ser seletivo em função da essencialidade das mercadorias e dos serviços (art. 155, § 2º, inc. III), o que significa dizer que, quanto mais essencial, menor deverá ser a sua alíquota, como ocorre por exemplo com os itens que compõem a cesta básica, que gozam desse benefício. Entretanto, mesmo sendo um item essencial à saúde feminina, o absorvente não é considerado um produto sanitário de primeira necessidade em nosso país, o que gera grande impacto na população de baixa renda. Não obstante, alguns estados engajados em amenizar os impactos da pobreza menstrual, alteraram sua legislação, como por exemplo o Rio de Janeiro, cujo Governador sancionou a Lei Estadual nº 8.924/2020, que inseriu o absorvente higiênico feminino como item essencial na composição da cesta básica, reduzindo a alíquota básica incidente sobre as operações internas com o produto. Tal medida vem servindo de exemplo para outros estados como o Ceará e o Maranhão², que adoram medidas semelhantes. Perpassando a questão tributária, na contramão do veto presidencial, o Governador do Estado do Pará, à época da sanção da Lei nº 14.214/21, se limitou a anunciar que iria começar a distribuir, gratuitamente, absorventes para mulheres e meninas, inclusive as estudantes da rede pública, que estão em situação de vulnerabilidade5. O Município de Castanhal, como medida à coibição da pobreza menstrual, sancionou em 2021 a Lei Municipal nº 036 de 21 de setembro de 20216, que institui o programa de conscientização sobre a menstruação e de distribuição gratuita de absorventes higiênicos nas escolas e demais órgãos públicos, como postos de saúde. De acordo com a referida lei, além do estabelecimento de medidas de conscientização sobre a menstruação, fica garantido ao acesso a absorventes higiênicos nas unidades educacionais, na rede de enfrentamento à violência contra a mulher e nos serviços e programas de saúde do Município de Castanhal, de forma gratuita a serem disponibilizados pelo Poder Público. A referida lei ressalta, ainda, que será estimulada a distribuição de absorventes sustentáveis e, diferentemente do Decreto assinado pelo Presidente, é mais abrangente, não restringindo o acesso a absorventes apenas a determinadas categorias. Sem dúvida, a União, o Estado do Pará e o Município de Castanhal trouxeram avanços significativos no enfrentamento do problema. Porém, este é macro, ocorrendo em todo o nosso país. Desta feita, não podemos olvidar da importância, dentre outras medidas, dos benefícios fiscais como mitigação da pobreza menstrual e desigualdade de gênero. Referências: 1. MOREIRA, Kathlyn. “Improviso com papel higiênico ou paninho”: a realidade de mulheres que não têm dinheiro para comprar absorventes. GZH Comportamento, 2021. Disponível em: https://gauchazh.clicrbs.com.br/comportamento/noticia/2021/09/improviso-com-papel-higienico-ou-paninho-a-realidade-de-mulheres-que-nao-tem-dinheiro-para-comprar-absorventes-cktlg1pyo000e013brkngbhnr.html. Acesso em: 06 de março de 2022. 2. SOUSA, Tainã Almeida Pinheiro de. “Tampon tax”: a tributação do absorvente feminino no Brasil e a pobreza menstrual. Migalhas, 2021. Disponível em: https://www.migalhas.com.br/depeso/353388/a-tributacao-do-absorvente-feminino-no-brasil-e-a-pobreza-menstrual. Acesso em: 06 de março de 2022. 3. ANGEL, Martínez. Pressão popular obriga Governo da Índia a eliminar o imposto sobre absorventes. El País, 2018. Disponível em: https://brasil.elpais.com/brasil/2018/07/22/internacional/1532269945_467781.html. Acesso em: 06 de março de 2022. 4. Associação Comercial de São Paulo. Impostômetro, 2022. Disponível em: https://impostometro.com.br/home/relacaoprodutos. Acesso em: 06 de março de 2022. 5. Governo do Pará anuncia distribuição de absorventes femininos às meninas e mulheres do Estado. O Liberal,